sábado, 29 de maio de 2010

Afinal o que é a arquitectura?


Cada pessoa tem uma vivência própria que nos vai moldando com o passar dos anos. É esta experiência adquirida que nos vai definindo como pessoa e também arquitectos. É verdade que muitas das atitudes e decisões que toma-mos são influenciadas por tudo aquilo que já vivemos e sentimos. Desde novo o mundo da arquitectura me fascinou, ou melhor o mundo da construção, isto porque as bases arquitectónicas eram poucas ou nenhumas, o gosto surgiu sim pelo interesse de ver algo produzido em papel, pudesse crescer, transformando e dividindo espaços. “O génio e a sua criação”. A arquitectura surgiu como um desejo natural, apesar de inicialmente haver poucas bases que sustentassem esta opção. “Primeiro estranha-se e depois entranha-se”, é assim que posso justificar as primeiras impressões neste mundo complexo da arquitectura, e aquilo que sinto actualmente.
Escolher um edifício que me defina como arquitecto, é algo que actualmente será complicado de fazer. Se fosse no primeiro ano, com as poucas bases existentes e com alguma ingenuidade sobre este tema, possivelmente seria fácil de responder a este desafio, claro está, de uma forma inconsciente. No entanto, com todo este conhecimento adquirido ao longo de cinco anos, torna-se demais evidente que esta resposta tem que ser encarada com ponderação e bem sustentada. Por isso para mostrar a minha visão sobre a arquitectura, a minha maneira de ser neste ramo, não o poderei fazer com apenas um edifício.
A arquitectura para mim tem se marcar pela simplicidade de pela racionalidade. Tudo tem que ter um sentido, um objectivo. Como diz o arquitecto Souto Moura, “os arquitectos são os terapeutas da natureza.”, ora se a arquitectura for resultado de um “capricho exuberante” de um arquitecto, esta “terapia” pode prejudicar seriamente a própria natureza, transformando-a em algo que não se pretende.
Posto isto, e de uma maneira inconsciente, se este questão me tivesse sido colocada no primeiro ano do curso, respondia prontamente que era a Casa da Cascata, de um tal de Frank Lloyd Wright. E porquê? Porque era encantadora, e porque aparecia nos livros de Teoria do Design do 12º ano. Mal eu tinha noção que aquela obra era o quase o resultado de uma fusão entre a arquitectura e a natureza, onde a simplicidade e a horizontalidade se inserem no terreno, de uma forma discreta, através dos materiais utilizados. Ou seja, posso dizer que a arquitectura começou a “descodificar” todos estes conceitos que estavam pouco sustentados na minha cabeça, veio-me dar a entender o porquê das coisas e sobretudo ajudou-me a olhar para a arquitectura com outros olhos. Estes olhos foram-se abrindo cada vez mais, e estou certo que se continuaram a abrir e com certeza nunca iram estar completamente abertos, haverá que faltar sempre alguma coisa para aprender e para perceber.
Apesar disto vou-me “contrariar”, dizendo que recentemente numa viagem a Roma, presenciando in loco, todos aqueles monumentos desde o Coliseu Romano, à Basílica de S. Pedro no Vaticano, me comoveu e mexeu comigo. Ali percebi que a arquitectura pode ser sinónimo de poder e de supremacia em relação ao Homem. Ali sentimo-nos pequenos, não pela toda carga simbólica e religiosa que estes edifícios carregam, mas sim pela sua escala e monumentalidade. A arquitectura desde cedo se tornou numa arma política, como uma demonstração de poder político, mais ou menos evidente.
Mas a arquitectura não se traduz só em matéria, em algo construído, pode ser um desenho de um simples espaço urbano, com pouca coisa que se possa materializar-se em algo edificado. A arquitectura no fundo é isto, criar e modelar espaços com qualidade.
E espaços com qualidade quanto a mim, apesar de não ter grande conhecimento sobre o edifício, consigo encontra-los no Museu de Arte Contemporânea de Serralves, no Porto. Aqui sinto a arquitectura a funcionar para o Homem, onde a subtileza de implantação do edifício cria uma interligação harmoniosa entre o exterior e o interior, onde o enquadramento exterior é o complemento da arquitectura, onde a luz natural é um elemento preponderante na concepção dos espaços, e aqui sim, sinto-me bem, aqui sim, vemos que arquitectura é simples, mas que o simples é difícil de idealizar.
José Saramago diz que “o arquitecto tem o cérebro na ponta dos dedos”, e se existe alguém que esta frase encaixa, esse alguém é sem dúvida o arquitecto Álvaro Siza Vieira. Este ícone da arquitectura portuguesa, pela maneira que se expressa, de onde um simples esquisso rápido e criativo, se torna num ponto de partida para a idealização de uma obra. A arquitectura produzida por este arquitecto é algo que me identifico facilmente. É uma arquitectura de fácil percepção, onde o arquitecto não precisa de explicar e sustentar muito a sua obra, porque o resultado final, mostra e expõe todas as suas razoes e é isso que procuro na arquitectura. A arquitectura tem que ser uma obra de arte, identificada com o seu próprio lugar, o lugar e a arquitectura são indissociáveis. Neste aspecto o arquitecto Siza Vieira, no meu ponto de vista, é extremamente bem conseguido.
É claro que não é só esta obra que me cativa, existem outras deste mesmo arquitecto, como a Biblioteca de Viana do Castelo, o Complexo desportivo em Cornellà de Llobregat, Barcelona e a Adega Mayor em Campo Maior, por exemplo. Contudo não me remeto a somente um arquitecto, gosto de arquitecturas de vários outros arquitectos, tenho uma mente aberta, e onde posso gostar de qualquer obra, desde que com um conceito bem estruturado e com sentido. Apesar disto custa-me um pouco a aceitar alguns movimentos arquitectónicos surgidos recentemente, e que são fruto para um mercado exibicionista onde a arquitectura se torna a parte menos importante, onde as formas exuberantes e extravagantes ultrapassam a barreira do bom censo.
Em jeito de conclusão posso dizer que é notável o quão abrangente é a arquitectura onde desde as suas raízes históricas aos nossos dias, fazem parte integrante de qualquer arquitecto. Com isto afirmo que a arquitectura cada vez me fascina mais, apesar de dar bastantes dores de cabeça, o resultado final é sempre gratificante, sendo certo que este sentimento se vai cada vez mais apropriar-se de mim, há medida que os anos vão passando.

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